O presidente Jair Bolsonaro (PL) criticou legislação que autoriza aborto no Brasil e que permitiu a uma menina de 11 anos que foi estuprada interromper a gravidez.
A criança engravidou após ser estuprada e, à Justiça, disse que não queria seguir com a gravidez.
Ao comentar o caso numa rede social, Bolsonaro afirmou que “não se discute a forma como ele [o feto] foi gerado, se está amparada ou não pela lei” e classificou o procedimento como “barbárie”.
O presidente disse saber que se trata de um caso sensível e que tanto a criança como o feto são vítimas.
Nas postagens, o presidente destacou que o feto tinha 29 semanas. A legislação brasileira que autoriza o aborto não estabelece limite máximo de idade gestacional para interrupção da gravidez.
Bolsonaro afirmou, ainda, que pediu aos ministérios da Justiça e dos Direitos Humanos que investiguem o caso.
A menina descobriu a gestação quando tinha 22 semanas. Segundo a advogada da família, a menina procurou o hospital federal da Universidade Federal de Santa Catarina para realizar o aborto.
O hospital, entretanto, orientou a família a buscar uma autorização judicial para o procedimento. A instituição argumentou que usa esse procedimento a partir de protocolos e normas do Ministério da Saúde quando a gravidez passa as 20 semanas de gestação.
Uma norma técnica do Ministério da Saúde de 2012 recomenda que a interrupção da gravidez ocorra até 20 semanas, mas a legislação brasileira não estabelece esse limite nem exige autorização judicial para realização do aborto.
A família obteve a autorização judicial. Em 1º de junho, entretanto, a juíza do Tribunal de Justiça de Santa Catarina Joana Ribeiro, que então atuava na comarca de Tijucas (SC), determinou que a criança fosse afastada da família e enviada para um abrigo, impedindo a realização do aborto.
Segundo vídeos divulgados pelos sites Intercept e Portal Catarinas, que revelaram o caso, em uma audiência judicial, a juíza perguntou à criança se ela “suportaria ficar mais um pouquinho” para aumentar chance de sobrevida do feto. E questionou-a se ela desejaria ter o bebê — a menina disse que não.
Após a repercussão do caso, o Ministério Público Federal recomendou que o hospital universitário realizasse o aborto, o que ocorreu na quarta-feira (22).
A juíza é investigada pelo Conselho Nacional de Justiça e e pela corregedoria do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. A promotora que atuou no caso e aparece na audiência é investigada pelo Conselho Nacional do Ministério Público e pela corregedoria geral do MP catarinense.
Em nota sobre o caso, a juíza disse que não se manifestaria sobre a decisão que tomou. A reportagem procurou a promotora por meio do MP, mas não obteve retorno.
A notícia do pedido do PF foi divulgada enquanto o presidente estava em um encontro com prefeitos em um hotel em Brasília.
“Acredito que fizemos muito levando-se em conta o que aconteceu na pandemia no Brasil. Eu lamento e muito uma pressão enorme em cima dos médicos contra a sua liberdade. O médico sempre teve liberdade para clinicar, sugerindo medicamentos para o seu paciente em comum acordo com o mesmo ou com a família para que esse medicamento fosse administrado. Pode ter certeza de uma coisa: notícias já começam a aparecer e brevemente nós saberemos que muitas vidas poderiam ter sido evitadas no Brasil se os médicos tivessem realmente a plenitude, a sua garantia de clinicar”, afirmou Bolsonaro durante o evento.
A PF também solicitou permissão para tomar o depoimento de Bolsonaro sobre o assunto. A investigação apura informações divulgadas por Bolsonaro em uma transmissão ao vivo realizada em junho do ano passado, na qual ele citou uma relação inexistente entre a vacina da Covid-19 e o aumento do risco de desenvolver Aids.
Para a PF, essa associação poderia ser classificada como uma contravenção penal de “provocar alarma a terceiros, anunciando perigo inexistente”. A contravenção é uma infração penal considerada de menor gravidade, punível de forma mais branda pela legislação.
Outro trecho, entretanto, foi considerado mais grave no relatório parcial da PF. Nele, o presidente citou uma informação falsa, de que as vítimas da gripe espanhola morreram em maior parte por causa do uso de máscaras do que pela gripe. A PF diz que o fato se enquadra no delito de “incitação ao crime”, previsto no Código Penal e que prevê pena de detenção de três a seis meses, ou multa. Em seu discurso para prefeitos, Bolsonaro defendeu as ações do governo no combate à pandemia, e destacou a compras de vacinas. O presidente voltou a afirmar que colocou “a liberdade acima de tudo” e citou pedidos no STF para compra de vacinas contra a varíola dos macacos. Neste momento, o titular do Planalto afirmou que aguardava a decisão do “nosso Supremo Tribunal Federal”, uma mudança de tom nas declarações sobre à Suprema Corte, alvo frequente de suas críticas.
“Nós compramos mais de 500 milhões de vacinas no Brasil. Por parte do governo federal não obrigamos a ninguém a tomar a vacina. A liberdade sempre acima de tudo. Não obrigamos que ninguém tivesse o passaporte vacinal para retirar um documento em algum lugar, para matricular em escola, seja o que for. É a liberdade acima de tudo. É igual aqui, começa a falar da varíola do macaco. Já se fala, tem um partido aí de esquerda, que entrou no supremo, entre outros pedidos, para que eu compre vacina para essa questão da varíola dos macacos. Estou aguardando para ver qual é a decisão do nosso Supremo Tribunal Federal.”
Bolsonaro foi nesta terça-feira à cerimônia de posse do ministro Alexandre de Moraes como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Segundo interlocutores do governo, o presidente já estava ciente que receberia duros recados durante a posse.
Em outro momento, o presidente também se referiu a Alexandre de Moraes como “nosso ministro” quando foi questionado sobre decisão do ministro Edson Fachin, que deixou a presidência do TSE ontem, de aumentar o número de militares que participam do grupo de análise do código-fonte das urnas eletrônicas.
“Todo esse assunto está sendo tratado exclusivamente pelas nossas Forças Armadas, pelo ministro da Defesa, com a equipe agora do nosso ministro Alexandre de Moraes”, respondeu o presidente. Integrantes do governo vêm trabalhando nos bastidores para costurar um acordo com o novo presidente do TSE para acolher as sugestões das Forças Armadas para as urnas eletrônicas, cujas segurança é questiona frequentemente pelo presidente sem provas.
Ações do governo
Seguindo a estratégia desenhada por sua equipe de campanha, Bolsonaro ressaltou aos prefeitos algumas ações da sua gestão, entre elas as voltadas para o campo. Na fala, o presidente afirmou que os produtores rurais foram menos fiscalizados pelo ICMBio e o Ibama.
“Da nossa parte o produtor rural passou a não se preocupar tanto com as visitas dessas pessoas do Ibama, ICMBio, que não iam mais com a caneta na mão e o bloco na outra mão. Então o campo foi bastante ajudado nessa área. Como foi ajudado também na questão de armas. A propriedade privada é sagrada, não interessa se é apartamento, uma chácara ou uma fazenda, ela é sagrada, não pode ser invadida”, disse Bolsonaro.
Bolsonaro ainda exaltou as medidas do governo que aumentaram o número de armas de fogo, não apenas na área rural, mas também nas cidades.
“Quando muitas críticas caiam sobre nós que por decretos e portarias facilitamos sem transigir a lei a concessão de posse e porte de arma de fogo a violência caiu no brasil, e caiu de forma bastante violenta, vamos assim dizer. Política que deu certo no campo e na cidade”, afirmou o presidente.
Aos prefeitos, Bolsonaro disse que nesta quarta-feira com a equipe econômica do governo sobre a previsão no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de zerar os impostos federais na gasolina, diesel, álcool e gás de cozinha. O chefe do Executivo mencionou também a possibilidade de zerar os tributos sobre o querosene para o avião. “Hoje tive uma nova conversa com parte da equipe econômica do Paulo Guedes sobre o PLOA. O nosso orçamento para o ano que vem. Garantimos para o ano que vem continuar com zero imposto federal na gasolina, do diesel, no álcool e no gás de cozinha. Pedi o pessoal agora para ver se pode zerar também os impostos do querosene de aviação.”